Familiares sofrem mais com câncer do que paciente, diz estudo

Aos 32 anos, enquanto dirigia, a professora Renata Lujan percebeu um volume diferente entre o seio e a axila. Era época de provas e ela não se preocupou, deixou a ida ao médico para depois.

Quando finalmente fez os exames, cerca de 2 meses depois, Renata descobriu que tinha câncer de mama.

Faltavam 4 meses para o casamento com o vendedor Rafael Mufalo.

“Eu só pensava no meu cabelo, como qualquer noiva. Eu queria um véu de quase 12 metros, o que iria sustentar, como eu iria colocar esse véu? Quando eu cheguei em casa o Rafa falou para mim: você pode morrer? Essa foi o primeiro momento em que eu tive contato com o viver e morrer”, conta.

O casal decidiu manter os planos e a festa aconteceu entre uma sessão de quimioterapia e outra. Renata usou o tradicional vestido de noiva. Ao longo dos quatro meses, ela perdeu os cabelos devido ao tratamento. Mesmo assim usou véu, com a ajuda de uma peruca.

Um ano depois, veio outro diagnóstico: o câncer de mama era metastático, ou seja, tinha se espalhado para outras partes do corpo. Embora com medo e com insegurança em relação ao futuro, decidiu que iria viver, e principalmente, ter qualidade de vida.

O que foi fundamental para ela conquistasse isso? O apoio de amigos, familiares e do marido.

“Ele sempre teve muita empatia com meus desafios diante da doença. Compartilhou os medos, as tristezas e incertezas. Tudo mudou muito na nossa relação e isso me fortalece muito a cada dia. Com ele não tenho vergonha de chorar nem de gargalhar”.

Hoje, com o apoio do Rafael, ela conta que enfrenta a doença, convive com a rotina do tratamento e vive feliz.

 

“Tenho metástases no fígado, nos ossos e ontem descobri que tenho três novas lesões no cérebro. Talvez, há três anos eu estaria morando embaixo da minha cama, chorando, mas o sentimento é de esperança, porque eu estou a esperar o próximo tratamento. A gente acaba tendo esta força. Sigo confiante e feliz”.

O câncer de mama é o tipo de câncer mais comum entre as mulheres no Brasil. Afeta 65 a cada 100 mil mulheres. A idade média das pacientes é de 51 anos, mas em 25% dos casos, a doença se manifesta antes dos 50.

Para entender melhor como mulheres como a Renata encontram forças para lutar contra a doença, a Pfizer desenvolveu uma pesquisa com 170 pacientes com câncer de mama metastático e 240 familiares em nove capitais do Brasil: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Fortaleza, Belém, Curitiba e Porto Alegre.

O resultado é um panorama que tem como objetivo guiar equipes médicas, pacientes e famílias no enfrentamento da doença.

Reações ao diagnóstico

O estudo mostra que, ao receber o diagnóstico, tanto pacientes quanto familiares têm os mesmos sentimentos: medo, tristeza e insegurança. A diferença é que nas mulheres com câncer de mama metastático, o medo é maior, enquanto que nos familiares o sentimento predominante é a tristeza.

A pesquisa também mediu a percepção do sofrimento, ou seja, o quanto cada um considera que sofreu ao descobrir a doença. O resultado surpreende. Entre as pacientes, 72% afirmaram que sofreram muito. Entre os familiares, esse índice foi de 88%.

O oncologista Sérgio Simon, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, explica que o familiar sofre porque percebe a tristeza da paciente, fica angustiado e com medo.

“Os familiares ficam mais angustiados. A paciente, muitas vezes, tem doença assintomática, ela descobriu em um exame que ela tem metástase no asso, mas ela não sente dor, ela não sente nada. O sofrimento dela é um sofrimento imaginário, mas o sofrimento do familiar, muitas vezes, é maior do que o dela”.

“Muitas pacientes sentem que aquilo é uma sentença de morte a curto prazo da qual ela não vai escapar. E não é verdade. Algumas pacientes vivem anos e anos, décadas, com doença metastática”
Sérgio Simon, oncologista
O médico destaca que é preciso entender que a vida pode continuar e pode ser boa depois do diagnóstico:

“Muitas pacientes sentem que aquilo é uma sentença de morte a curto prazo da qual ela não vai escapar. E não é verdade. Algumas pacientes vivem anos e anos, décadas, com doença metastática. Em novembro eu e uma paciente minha comemoramos bodas de prata, ela começou a tratar a doença em novembro de 1992 e em novembro de 2017 nós fizemos 25 anos de médico-paciente”.

A pesquisa mostrou, ainda, que quem mais apoia as pacientes são os maridos, ou parceiros, 29%, os filhos, 28% e as mães, 19%.

O tipo de apoio é bem variado, vai desde o acompanhamento nas consultas, as palavras positivas, até as atividades práticas do dia-a-dia como cuidar da casa, fazer compras ou levar os filhos na escola.

 

Casamentos desfeitos e vida profissional comprometida

O tratamento exige tempo e desgasta as pacientes por conta dos efeitos colaterais. Isso interfere diretamente na vida profissional das mulheres. Entre as entrevistadas, 35% disseram que precisaram parar de trabalhar para cuidar da saúde.

O lazer também foi afetado. Entre as coisas que elas mais gostavam de fazer e tiveram que abrir mão, está o hábito de viajar com a família ou amigos, indicado por 50% das entrevistadas. Em segundo lugar estão os passeios do fim de semana e em terceiro o hábito de beber socialmente com os amigos.

Embora os maridos sejam os principais parceiros na luta contra a doença, alguns casamentos não suportam o diagnóstico.

De acordo com a pesquisa, 46% das mulheres eram casadas antes de descobrir a doença. Depois do diagnóstico, esse número caiu para 41%. O estado onde o número de divórcios foi maior foi São Paulo. O número de mulheres divorciadas aumentou 12% depois da doença.

Para o oncologista Sérgio Simon, isso não acontece com casamentos felizes.

“Isso não é muito comum, a não ser em casais onde já havia problemas antes, no qual o câncer vira uma desculpa para se terminar a relação. Em geral, a relação continua e continua bem e, às vezes, até melhor do que antes do diagnóstico”, destaca o especialista.

Um casamento que se fortaleceu depois do diagnóstico é o do representante comercial Jadyr Galera, 60, casado com Elfriede há 35 anos.

O diagnóstico do câncer de mama com metástases chegou para ela em 2010, quando começavam a realizar o sonho de construir um veleiro para dar a volta ao mundo. O sonho não foi adiado, mas transformado, como dizem.

Dar a volta ao mundo leva dois anos, tempo demais para ficarem longe do tratamento. Mesmo com a quimioterapia e os efeitos colaterais severos, eles construíram o veleiro e hoje viajam pela costa do Brasil. Viajam e lutam juntos contra o câncer e pela qualidade de vida.

“Nós, até hoje, lutamos muito para fazer tudo juntos, então vamos continuar juntos. Ninguém pode falar ‘você vai morrer amanhã’, você tem que lutar. A união da família foi muito importante para que ela tivesse força para lutar contra a doença”, destaca, emocionado, o marido.

 

R7